Não adianta falar
coisa alguma.
Os ouvidos
se fechem automaticamente quando não se quer ouvir.
São como os olhos
caídos de sono que não que não respeitam coisa alguma.
O sono atropela as coisas
A falta de paciência
também.
A intolerância e
todos os bichos mordazes que vão nos roendo as entranhas também.
Os desejos que guardamos dentro de minúsculas caixinha de
musica, também.
Guardamos os medos pra ninguém ver.
Pra ninguém notar que existem.
E os medos, aqueles medos de falta de amor de mãe, de medo que o pai morra e que o céu caia
sobre as nossas cabeças permanecem por mais tempo que deveriam.
O que são esses medos?
Medo de envelhecer e perceber que igual adolescentes, não sabemos pra onde ir.
Porque estamos ali, numa zona desconhecida, e pior, sabemos o que pode vir pela frente.
Algumas vezes, não esquecemos do que deixamos pra trás.
Mas medo mesmo eu senti, no dia que sonhei que acordava.
Eu tive um sonho
e pensei que estava acordada.
No meio da noite eu abri os olhos, e o céu estava de um
vermelho alaranjado.
Eu sabia que era de manhã, meus instintos sabem de manhãs,
mas as sombras carregadas impediam de identificar se era dia ou se era noite.
Mas eu sabia que era dia.
Percebia a manhã como o poeta percebe a palavra.
Eu devia estar acordando aquela hora. Era a hora que o despertador sempre tocava.
Todos os dias, religiosamente, todos os dias, na mesma hora, com sua música enjoada.
A janela da sala estava aberta e o vidro trepidava de mansinho com o vento que batia nas árvores mas não chegava até mim.
De repente, um enorme anjo caiu na meio da sala.
Não pude ver seu
rosto porque ele era gigante.
Só pude ver os dedos dos seus pés.
Descalços.
Não sei se os dedos eram brancos ou marrons.
Transparentes.
Eu tremia, um tremor revolvido, que vinha das profundezas
dos meus medos infantis quando achava que o mundo ia acabar por um estalar de
dedos do aiatolá khomenini e seus olhos
caídos.
Num frenesi eu sabia que
tudo estaria acabado, em poucos minutos.
O anjo apocalíptico veio me buscar.
Ele estava ali no meio
da minha sala e eu não conseguia ver seus olhos.
Mas ele estava ali.
Um gigante devorador, e eu nem pude ver se ele tinha asas.
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